A narrativa lembra os filhos que foram mortos por agentes do Estado
Trabalho literário traz casos que pedem soluções e justiça
Lançado em Novembro de 2022, pela editora: Fábrica de cânones. o livro Mães em Luta incomoda autoridades políticas e policiais que vestem, ou não, a carapuça da cumplicidade.
Em 144 páginas, são narradas sete histórias, contadas por sete mães que tiveram os seus filhos assassinados por agentes do Estado. O trabalho é de autoria do Movimento Mães em Luto da Zona Leste.
Mães em Luta traz a realidade das periferias brasileiras, territórios onde aparentemente existe uma guerra declarada de um só lado, o do poder bélico estatal contra os moradores, como pontua Paulo Sérgio Pinheiro.
"A polícia militar desempenha um papel de força de ocupação nas comunidades mais pobres nas periferias de metrópoles. Um regime de segregação racial prevalece contra a população negra. Os negros são permanentemente alvos do racismo na sua vida quotidiana: em relação aos brancos, recebem salários inferiores e sentenças mais pesadas pelos mesmos crimes, configurando um estado de coisas que, além de inconstitucional, é no mínimo torpe e imoral".
Paulo Sérgio Pinheiro entende muito sobre o tema, ele foi ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, e também membro e coordenador da Comissão Nacional da Verdade.
Em meio ao cenário de guerra urbana, os corações das mães cujos filhos tombaram mortos exprimem sentimentos que foram para as páginas do livro. Trazem a dor da perda, o sofrimento pela ausência e o pior: uma quase certeza de que os assassinos ficarão para sempre cobertos pelo manto da impunidade.
“Tudo se define em saudade / Saudade do colchão na sala / Saudade do banho demorado/Saudade de você chamando para abrir o portão/ Saudade de teu beijo na testa/Saudade de esperar você chegar/Para que a minha dor, a minha saudade sejam menores imagino que você foi viajar / Uma viagem longa/ Mas vai voltar e certamente vamos nos encontrar.”, escreve Gilvania Reis Gonçalves, 49, mãe de Guilherme Gonçalves)
Outra mãe, Solange de Oliveira Antonio, de 50 anos, tece letras para o filho Victor Antonio Brabo. “Victor, a distância que no momento nos separa jamais será maior que o amor que nos une.”
Os relatos doem a alma de quem já vivenciou a situação de impotência aumentada pela cumplicidade de um Estado conivente com a violência, alheio ao sofrimento dessas e de outras mulheres, e de outras pessoas. Na sucessão de fatos a própria justiça fica sob suspeita.
“Justiça, algo de que se precisa, mas ela pode ser cega. / Justiça que pode ser feita e não é. / Justiça que é feita / Justiça que todos querem, mas nunca vem / Justiça que todos precisam e é feita. / E essa justiça que nós, todas as mães, queremos / Justiça não cega / Justiça nítida”. O que soa como uma súplica foi escrito por Tatiana Lima Silva, 42, para seu filho Peterson Silva de Oliveira.
O trabalho literário nasceu da solidariedade de pessoas que acompanham e participam do Movimento Mães em Luto da Zona Leste.
"É por isso que o movimento Mães em Luto considera ser este um livro-luta: porque põe a circular publicamente essas vidas e suas histórias que o Estado pretende apagar e busca fazer a sociedade ver a violência em curso. Um livro que se destina, também, às próximas gerações com importante dimensão de transmissão. Um livro que disputa com as reportagens dos grandes jornais a versão dos fatos. Enfim, dores que viraram palavras, poemas, cartas, fazendo circular pelo mundo a vida de sete jovens, suas famílias, seus territórios, nossa sociedade, nosso mundo”, afirma a pesquisadora Claudia Trigo. Ela compôs a equipe e auxiliou a construção do livro.
As autoras do livro são: Gilvania Reis Gonçalves, Maria Medina Costa Ribeiro, Miriam Damasceno da Silva, Rossana Martins de Souza Rodrigues, Sidineia Santos Souza, Solange de Oliveira Antonio e Tatiana Lima Silva.
O livro Mães em Luta pode ser comprado acessando https://fabricadecanones.com.br
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