Bertioga não tem uma boa educação
Professor universitário afirma que educação não se mede pelo IDEB
Por Claudemir Belintane (*)
Explanação é um alerta à comunidade estudantil - Foto: Tânia Rego / Agência Brasil
Nas eleições municipais deste ano, muitos prefeitos afirmavam que em suas gestões a educação teria avançado bastante e citavam o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) do Município, que teria alcançado ou superado a meta prevista.
Infelizmente o povo e às vezes até mesmo educadores não entendem que o IDEB é um índice geral muito precário e que não serve para indicar avanços qualitativos no panorama nacional, estadual ou regional da educação. Além de não servir como parâmetro e avanços nem em Língua Portuguesa, nem em Matemática, o IDEB é também muito fácil de ser fraudado ou mesmo manipulado.
Então, como nós, cidadãos, podemos saber se uma rede escolar ou a educação de um município vai bem? O teste é simples e objetivo, você mesmo pode fazer. Vamos lá!?
Tomemos como exemplo o município de Bertioga e vejamos se as questões abaixo podem ser respondidas afirmativamente por educadores, pais ou mães de aluno(a)s do Fundamental II (seja dos anos iniciais ou finais, 6º ao 9º ano):
1) Seu filho ou sua filha consegue ler um texto de uma página de extensão com fluidez e, ao mesmo tempo, compreender o sentido geral nele contido? Por exemplo, ler uma notícia curta de jornal e resumir com precisão o que o texto diz? Consegue ler uma crônica e explicitar mesmo que verbalmente sua mensagem?
2) Ele ou ela consegue comentar algum episódio da História de Bertioga? Sabe dizer por que a grande avenida principal que corta a cidade se chama Anchieta? Consegue dizer alguma coisa sobre a Confederação dos Tamoios? Sabe quem foi Cunhambebe, Martim Afonso de Sousa, João Ramalho e outros nomes estampados nas placas de ruas de sua cidade? Diante de um turista, saberia comentar alguma coisa sobre o forte São João ou sobre outros pontos da História da fundação de Bertioga ou mesmo sobre seu ambiente natural?
3) Sabe escrever um texto de uma página resumindo o que leu em alguma reportagem de jornal? Teria condições de ajudar o pai ou a mãe ou a si mesmo, escrevendo um orçamento, uma carta, uma solicitação de emprego etc.
4) Utiliza as quatro operações com agilidade? Resolve problemas de percentagem? Consegue entender o que significa uma letra (incógnita) em uma equação de primeiro grau? Entende o conceito ou sabe resolver potências e raízes quadradas de baixa complexidade? Conhece um pouco de geometria plana (teoremas de Tales e de Pitágoras, propriedades e classificação das figuras planas)? Consegue ajudar o pai ou a mãe no balanço de receitas e despesas da família?
5) Sabe usar bem as tecnologias digitais de hoje ou apenas consome diversão barata nas redes sociais e nos aplicativos para computadores e celulares?
6) Tem interesse por eventos culturais para além do que a televisão e a mídia consumista empurram pra eles? Frequenta biblioteca e centros culturais?
7) Enfim, consegue se servir minimamente do que aprende na escola? Em outras palavras, percebe que a educação ajuda a viver e a conviver?
Se as respostas não forem satisfatórias, a (o) cidadã(o) já saberá que o futuro de sua descendência já estará parcialmente condenado. Quer perceber onde mora a culpa?
Além de perguntar a crianças e adolescentes, pergunte ao adulto, ao Sr. Secretário da Educação de Bertioga. Pergunte se o PME (Plano Municipal de Educação) explicita bem uma pedagogia capaz de contextualizar as singularidades de Bertioga – exemplo: o fato de ser município litorâneo, de ser estância turística, de ter um ambiente que requer atitudes preservacionistas implicaria em uma pedagogia diferenciada?
Indague se as escolas desenvolvem projetos que despertam nos alunos alguma consciência em relação à sua prosperidade ou a de suas famílias. Se o currículo prevê formações e projetos vocacionais que apontem para o futuro do trabalho, da pesquisa, das tecnologias?
Insista ainda se há investimentos sólidos na formação do corpo docente, suficientes para garantir uma educação de qualidade para o município. Também é relevante saber se Bertioga participa de algum circuito nacional de Feiras de Ciências ou de outros eventos culturais dedicados à infância e à adolescência?
A resposta possivelmente será despistadora. Não fará mais do que elencar uma listinha de um ou outro projeto que só sai do papel pra turista ver (como acontece com a educação ambiental, que ocorre uma vez por ano como se fosse de fato uma prática escolar cotidiana).
Quem lê o Plano Municipal de Educação de Bertioga e de alguma outra cidade ruim de educação, vai perceber que em nada se diferenciam. Apresentam informações sobre o município na introdução, que vão desde uma ínfima História do lugar (na visão dos vencedores) a dados socioeconômicos do IBGE, mas sem estabelecer as necessárias relações entre essas informações e o currículo escolar e, muito menos, permear minimamente o cotidiano de cada sala de aula com as singularidades do município.
Então, é isto: o IDEB serve para mascarar, enganar, tapar sol com peneira e sobretudo para esconder que o prefeito escolheu um secretário que nada entende de educação - um aliado submisso, que ajuda nas campanhas eleitorais e sabe blindar o executivo das complexidades que a educação libertária naturalmente implica.
Então, futuro prefeito, coragem! Faça diferença! Opte por uma educação pra transformar e não apenas pra mentir a partir do IDEB, como tem sido feito até agora. Escolha um secretário bem formado, democrático, capaz de mobilizar educadora(e)s, aluna(o)s, famílias, entidades e conselhos para planejar com eles uma educação livre e transformadora. É isso que vale à pena! É disso que Bertioga precisa!
Claudemir Belintane - Prof. livre-docente da FE-USP (cidadão bertioguense desde 2022) - claubelintane@gmail.com
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